As enchentes no Rio Grande do Sul: Brasil palco das mudanças climáticas por Cynthia Moleta Cominesi

Diante de toda a catástrofe que estamos presenciando no Rio Grande do Sul, simplesmente comentar sobre outro tema me faria sentir “leviana” perante toda a dor e perda que a população de lá está enfrentando. 

Ao longo de minha carreira como engenheira agrônoma focada em sustentabilidade, sempre me dediquei a entender e a combater os efeitos das mudanças climáticas, incentivando a adoção de boas práticas no agronegócio ou em qualquer outro setor. Porém, muitas vezes fui criticada e taxada de “ambientalista”, pelo meu discurso com foco na sustentabilidade. 

Recentemente, lendo vários artigos e/ou notícias que saíram no ‘Le Monde’ e ‘The Intercept’, e assistindo a uma discussão no ‘Jornal GGN’ com o climatologista Carlos Nobre, foi impossível não refletir sobre as enchentes no Rio Grande do Sul e o papel do Brasil no cenário climático global.

Um Panorama das Mudanças Climáticas

‘Le Monde’ frequentemente aponta o Brasil como um dos países mais vulneráveis às mudanças climáticas. Essa vulnerabilidade se manifesta não apenas em dados estatísticos frios, mas em histórias reais e devastadoras de perdas e danos. As enchentes no Rio Grande do Sul são um exemplo claro disso, onde a interação entre fenômenos naturais e a ação humana resulta em tragédias repetidas.

Recentemente, o ‘Jornal GGN’ abordou os mecanismos por trás das trágicas enchentes no estado. Carlos Nobre, pesquisador do Instituto de Estudos Climáticos da USP, explicou a dinâmica dos sistemas de baixa e alta pressão exacerbada pelas mudanças climáticas. O sistema de alta pressão no centro-oeste e sudeste bloqueia o sistema de baixa pressão vindo do Oceano Pacífico. As frentes frias, incapazes de avançar, acumulam-se e resultam em chuvas intensas no Rio Grande do Sul. Este fenômeno é alimentado por um intenso fluxo de vapor d’água que vem da Amazônia, passando paralelo aos Andes.

Carlos Nobre também apontou para a intensificação dos fenômenos El Niño, que, embora naturais e milenares, estão ocorrendo com frequência e intensidade sem precedentes devido ao aquecimento global. O último El Niño, um dos mais fortes já registrados, contribuiu para as secas severas na Amazônia e no Pantanal, além de potencializar as chuvas no sul do país. Essa dinâmica destaca como fenômenos naturais, exacerbados pela ação humana, estão reconfigurando nosso clima de maneiras imprevisíveis e perigosas.

O Relatório Ignorado

No meio de tudo isso, em 2015, um relatório crucial intitulado “Brasil 2040” foi publicado, delineando cenários futuros e propondo estratégias de adaptação às mudanças climáticas. No entanto, conforme destacado numa matéria que saiu no ‘The Intercept’ (06/05), este relatório não recebeu a atenção merecida dos governos subsequentes. A falha em agir sobre suas recomendações não é apenas uma oportunidade perdida; é uma lição sobre as consequências da inércia política e administrativa.

Reflexão e um Chamado à Ação

Como profissional dedicada à sustentabilidade, vejo esses estudos e relatos não apenas como validações de minhas preocupações ambientais, mas como um chamado urgente à ação. É essencial que tanto os governos quanto a população reconheçam e respondam à realidade das mudanças climáticas com a seriedade que ela exige. As enchentes no Rio Grande do Sul servem como um microcosmo das vastas e complexas questões que enfrentamos devido às mudanças climáticas. A ignorância e inação podem custar muito caro, como já estamos vendo.

Desta forma, como engenheira agrônoma e cidadã, reitero a importância de tratar a crise climática com a urgência que ela merece, para garantir um futuro mais seguro para todos nós.

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